A juíza Noemia Porto, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), participou, nesta segunda (10/6), de audiência pública, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para debater a atualização da Resolução CNJ nº 75/2009, que trata das regras de concurso para ingresso na carreira da Magistratura.
Segundo Noemia Porto, é preocupante o fato de um certame, que deveria ser capaz de selecionar pessoas que possam se inserir em um contexto de fortalecimento público, se transformar, preponderantemente, em mérito de realização individual e pessoal. “O que está em jogo é a discussão sobre melhores práticas e julgamentos daqueles que exercem importantíssima função social, qual seja, a função jurisdicional”, pontuou.
Nesse sentido, a presidente defendeu o aperfeiçoamento das formas de recrutamento para rejeitar a hipótese de que o recorte de idade é que seja definidor da melhor experiência; que o critério da interdisciplinaridade seja cobrado de forma transversal e não apenas em um único “guarda-chuva” e que a “doutrina dominante” receba uma abertura conceitual, especialmente para contemplar publicações diversas que sejam atestadas por sistemas criteriosos, como o da Capes, para se evitar a mera memorização.
No aspecto da interdisciplinaridade, Noemia Porto citou a juíza federal Clara Mora, diretora de Relações Internacionais da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e membro da Comissão Ajufe Mulheres, para quem os processos seletivos fortemente meritocráticos tendem a agravar comportamentos corporativos nos membros da Magistratura. “Assim, ao ‘ethos’ que prega o acesso à carreira como expressão de sucesso pessoal ou financeiro, estimulado pelo discurso que considera o ingresso na judicatura como uma vitória de quem tem mais ‘foco’ e ‘força’, deve se contrapor um outro que a enalteça como função pública”, explicou.
Sobre a fixação da idade mínima em 30 anos para ingresso no Poder Judiciário, como suposto de candidatos com maior experiência, a magistrada afirmou que o debate não parece se concentrar em aspecto realmente relevante. “De acordo com o censo realizado pelo próprio CNJ, a idade média de ingresso na carreira da Magistratura já é superior a 30 anos desde 1991. Além disso, não há qualquer correlação comprovada de que os poucos juízes que ingressam na Magistratura com menos de 30 anos apresentam baixa eficiência e comportamento indisciplinar”.
Já em relação aos saberes interdisciplinares e às competências jurídicas, a presidente da Anamatra esclareceu que há diferença entre informação e formação. “No campo extrajurídico, relacionamentos interpessoais, competências de gestão e de organização se revelam essenciais. A ‘doutrina dominante’ tem sido o equivalente à apreensão de informações contidas em manuais”, criticou.
A presidente da Anamatra defendeu, ainda, que seja estabelecido um diálogo real entre candidato e examinador, evitando a objetivação excessiva e artificial do conteúdo cobrado nas provas. Nesse ponto, para Noemia Porto, as bancas examinadoras devem contemplar a efetiva representatividade quanto ao gênero, raça e posições jurídicas, de modo a impulsionar a “pluralidade e a democratização da instituição”.
Especificamente em relação à questão de gênero, no final de sua intervenção, a presidente da Anamatra lembrou que integra o grupo de trabalho criado pelo CNJ para a elaboração de estudos, análise de cenários, eventos de capacitação e diálogo com os tribunais sobre o cumprimento da Resolução CNJ 255/2018. O ato normativo instituiu a política nacional de incentivo à participação institucional feminina no Poder Judiciário. “Temos o compromisso de discutir o acesso, pela questão de gênero, no âmbito dos concursos públicos”, disse, ao citar o baixo recrutamento de mulheres nas Magistraturas federal e estadual.