A Justiça do Trabalho é a área do Poder Judiciário que se faz mais presente no cotidiano das pessoas. Afinal, hoje as relações de trabalho acompanham praticamente todos os membros da sociedade brasileira, direta ou indiretamente, como um órgão imparcial para apaziguar as divergências nas relações de trabalho, de forma segura e pacífica.
Quando tentamos entender sua importância e sua construção, nos valemos da história. Hoje, aproveitamos a história de lutas, e toda a experiência do Juiz do Trabalho, e associado AMATRA21, José Dário de Aguiar Filho que, natural do Recife, no Estado de Pernambuco, escolheu o Rio Grande do Norte para trilhar sua brilhante carreira de janeiro de 1994 a maio de 2021. Inclusive, julga essa escolha como das mais acertadas de sua vida profissional.
Recentemente aposentado, o magistrado José Dário nem de longe pensa em parar. Ainda há muito a ser feito. Confira neste bate-papo da AMATRA21, que falamos sobre a Justiça do Trabalho, sua contribuição para esta regional, além dos planos para o futuro e conselhos aos mais novos.
1) Por que escolheu a Justiça do Trabalho para atuar?
O início da atividade profissional na advocacia se deu no segundo ano de direito, em escritório de advocacia que atuava em conexão com projetos de recuperação empresarial elaborados pelo escritório de planejamento econômico e financeiro na região metropolitana do Recife, denominado por APL – Assessoria, e Planejamento, integrado pelo economista Zito de Souza Leão, o advogado e competente deputado federal que abrilhantava a bancada da Paraíba, Dr. Aluízio Afonso Campos, e pelo norte-riograndense de formação pelo Cepal, Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo e Ranilson Machado.
Normalmente, existia problema de reescalonamento de obrigações mercantis, porém, a grande dificuldade residia na negociação e solução de passivos trabalhistas.
Tal vivência de pronto aguçou o interesse para o problema social. Ao lado disso, o professor na graduação na Faculdade de Direito do Recife, Dr. Francisco Solano Godoy de Magalhães, era consagrado juiz do trabalho de grande experiência e bom mestre, o que despertou o interesse pelo direito do trabalho por parte do signatário.
Em 1986 me submeti ao primeiro concurso à magistratura do trabalho da 6ª Região, não logrando êxito. Por desde dezembro de 1983 já se encontrar investido na função de advogado do BANCO DO BRASIL S/A, que à época propiciava a melhor remuneração dentre as careiras jurídicas do país, até juízes com que mantinha contato em audiências me desestimulavam ao ingresso na careira da magistratura trabalhista e bem como na estadual.
Quando de minha aprovação no segundo concurso realizado por esse Regional, já desempenhava a função de chefe de núcleo jurídico em Campina Grande (PB), não subsistindo praticamente diferença remuneratória, surgindo à época da posse no cargo de Juiz do Trabalho, oferta em função comissionada, a qual se apresentava mais vantajosa do que a função de magistrado.
Entretanto, pela amplitude da careira e maior segurança, pois se tratava de cargo cuja remuneração era integralmente efetiva e irredutível, além de deter prerrogativas mais amplas, não tive a menor dúvida, deixei minha velha casa e abracei de corpo e alma a carreira da magistratura, o que até hoje tenho por certo e não passei a deter qualquer arrependimento. Em síntese, foi uma das decisões mais acertadas que adotei em minha vida profissional.
2) A Justiça do Trabalho é o mais próximo de uma Justiça Social?
Com todas as suas dificuldades estruturais e deficiências de funcionamento é o único mecanismo permanente na estrutura do estado brasileiro que se apresenta como o último reduto ao resguardo dos direitos sociais.
O momento atual, no decurso da séria crise da pandemia do “Corona Vírus” impõe aos que fazem essa Justiça especializada uma paciente análise das difíceis situações econômicas e conflitos de interesses que lhes são submetidos.
Não se trata de rasgar os comandos advindos da legislação de proteção social, mas, de adequar os ajustes entre as partes, para mesmo que estendendo o prazo de satisfação das obrigações, adequar o cumprimento das dívidas, de forma a que o obreiro receba e o empregador possa pagar o máximo possível.
É inafastável que se ajuste alienação de bens, mesmo que de maneira parcelada com um prazo um pouco extenso, se obtendo um melhor preço de venda, com a compreensão entre trabalhador e empregador da excepcionalidade da situação.
Nesse ponto o papel o magistrado do trabalho é fundamental na solução do impasse, como moderador da situação, para encontrar uma solução de pagamento dos direitos do trabalhador e para viabilizar a que ao final subsista se possível algum recurso pecuniário, para que o empreendedor possa dar continuidade à atividade empresária, mesmo que em ritmo mais reduzido.
Há de se ter em mente que sem empresa não há emprego. Empresário e empregado não são adversos. Eles são companheiros de um empreendimento, quase como comensais, que têm que conviver e assegurar o êxito da atividade econômica, com moderação e ponderação, sem a exaltação de ânimos que indevidamente ocorrem quando de embate em negociações coletivas mal conduzidas.
Em síntese, a Justiça Social é uma construção dos atores das relações de trabalho e o magistrado no momento do impasse se trata de um moderador, um amigo, por vezes um agente que repreende as partes envolvidas, e ao final depois de ouvir os dois lados, propõe uma primeira, uma segunda, uma terceira solução, não pode nunca desistir, sua atuação é como a de um chefe de família, tem que manter a harmonia, ultimando por manter a força da união dos palitos de fósforos, sólidos e inquebrantáveis, todos juntos e unidos, em um único corpo, na unidade de uma caixa de fósforos.
Com esse espírito foi que tantas vezes vi se realizar a justiça social, e as partes acordaram, celebrando uma conciliação, que não acreditavam que chegariam, mas, que em momento algum, tive dúvida, me controlei, sacudi água nas larvas vulcânicas de meu temperamento, água com consistência e força de bálsamo, que a todos contagiou, e redundou na finalidade dessa justiça especializada, a de mais uma vez concretizar a vitória de nossa sociedade, com a realização da justiça social.
Em suma, a Justiça do Trabalho é o adesivo de interligação, é o aditical do cimento dos diferentes interesses que ao serem compatibilizados, redundam na justiça social.
3) Agora, falemos de futuro. Com a aposentadoria, quais os próximos passos, já que não estará mais intermediando/apaziguado os conflitos das relações de trabalho?
Já ando lendo atentamente as alterações implementadas na legislação de processos civil pelo novo código. Tenho o farto acervo de livros e sociologia, de direito, de criminologia, que as obrigações da magistratura inviabilizavam sua leitura, já que era comum trabalhar ao menos um expediente em dias de sábado e domingo, para manter em dia as decisões de maior vulto, ficando privado do prazer da leitura e de maior tempo de convívio com a família e amigos e os sobrinhos afetivos.
Mesmo com o desempenho da magistratura, aqui e acolá tinha que realizar levantamento de doutrina e jurisprudência de matérias especiais como concessões de materiais especiais cirúrgicos pelo SUS ou por planos de saúde, em decorrência de causa sob condução de colega de turma ou advogado amigo, de interesse de parente, amigo ou simplesmente de cliente do causídico, para trocar ideias sobre a melhor forma de se elaborar a postulação de natureza especial, e por vezes, a leitura de processos de área civil, mercantil, administrativo, para discutir se uma medida cautelar se afigurava como frágil e sujeita ao insucesso, da conveniência de postular na primeira instância e renovar ao relator do processo e por vezes ao ministro do Tribunal Superior, estudos que não me deixaram completamente afastados do processo civil puro e simples.
Agora com a disponibilidade de tempo e sem necessidade de trabalhar por “prata” necessária a sobrevivência, tenho há muito promessa com dois conceituados médicos amigos, que quando de minha aposentadoria, passaria a ser uma longa manus deles para concretização do bem, e parece que está chegando a oportunidade.
Ando pensando em retornar a estudar direito tributário, ramo que passa por séria modernização e adequação pela União Federal, o que deve vir a ser seguido pelas unidades federadas e autonomias municipais, com o avanço decorrente da “compliance”, em que ao invés de confronto e litígio com o contribuinte, o ente público se ajusta para solucionar as diferenças e incompreensões mediante ajustes administrativos. Tema novo e sedutor.
Também, há sempre processo de amigos e advogados próximos, em que se solicita uma revisada da peça, e que consiste também fonte em aprendizado e aprimoramento técnico profissional e de retribuição daquilo que o tempo me concedeu.
E existirá tempo para fins de semana na serra, na praia, em capitais de estados vizinhos, revendo velhas amizades, especialmente em Mossoró, João Pessoa, Recife e Salvador. Em síntese, há tanto o que fazer que não tenho razões para me preocupar.
4)O que diria para um jovem que está indeciso quanto a escolha da área de atuação na justiça?
A mesma orientação que meu velho me passou e que recebeu de meu avó e de meu tio avó Arthur de Sousa Marinho, no sentido de que procurasse se familiarizar com tudo o que fosse possível, todos os ramos que pudesse descortinar, e depois de dez anos, escolhesse um para mais se dedicar, pois a ciência do direito é única e interligada, e o profissional que se restringe e fica totalmente vinculado a uma especialidade, incorre no sério risco de dar uma solução adequado naquele ramo a que se dedica e muitas vezes, incorre em um ilícito de outro ramo do direito e até em um ilícito absoluto do âmbito do direito criminal.
Autor: Ascom AMATRA21